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Sentido Único?

Dez 1999

Sentado, sozinho, com o sol a bater-me nas costas, vou observando o fluir dos automóveis na estrada q me serve de horizonte. Brancos, pretos, azuis. Grandes, pequenos. Correndo depressa ou devagar. Com ou sem medo do que possa acontecer mais a frente. Todos normais. Todos percorrem a mesma estrada sob os olhares indiferentes dos outros q se passeiam lado a lado. Todos normais...

Mas quando saimos dessa estrada de vida e diversidade... quando paramos o carro na nossa rua, em frente a nossa casa, prontos para entrarmos numa intimidade q, inocentemente, pensamos ser só nossa... quando abrimos a porta... os dedos começam a esticar-se em nossa direcção. A sociedade começa a envolvernos nos seus braços, não para nos receber e acarinhar, mas para nos sofucar e magoar. Escreve-nos nas costas "tu és diferente" por aos outros sermos iguais. Cola-nos um selo e envia-nos desamparados para a vida, tendo ainda o sadico prazer de assinar o remetente. E o pequeno espaço reservado ao destino jaz, vazio...

Solto uma pequena lágrima que lentamente me percorre o rosto. Toca os meus lábios, e suavemente se espalha. Levo os dedos até ela... toco receoso nos lábios até então secos de permanecerem juntos. Lembro-me... a diferença que a sociedade teima em impor-me está também nos meus lábios. Porquê?!? São rosados como os outros. Sensiveis como os outros. Podem beijar como os outros. Anseiam ser beijados, como os outros. Anseiam pelo toque suave de um homem que os anseie também... São estes lábios que secaram de não falar, que agora procuram uma hipotese de gritar, de dizer ao silêncio... BASTA! Não me quero mais esconder. Não quero continuar a mentir a mim próprio...

Sou gay... mas acima de tudo sou um Homem. Sinto, choro, sorrio como qualquer homem ou mulher. Sou capaz de amar como qualquer homem ou mulher. Mas só por uma palavra serei diferente? Será que a minha forma de amar, sorrir, chorar, sonhar, sentir... é diferente do que era antes? Será que os olhares de carinho e amizade que antes recebia passarão a ser olhares de indiferença e desconfiança??? MERDA! Eu sou eu! Sempre fui assim! Só tive de me aceitar primeiro, para poder enfrentar a sociedade. Mas a sociedade continua a meter-me medo! Continuo escondido num poço com medo de espreitar e encontrar os olhos implacáveis prontos para me julgar...

Sou diferente aos olhos de uma sociedade que ainda não me conhece. Aos olhos de uma realidade que até agora esperei, sentado, que me abrisse os braços... nada aconteceu! Talvez seja hora de me tentar erguer e percorrer a estrada que encontrei, sem deixar que o Sol se esconda atrás de mim, mas fazendo-o caminhar à minha frente para me dar a força que procuro..."

noit&dia
 
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