Ao ler a entrevista com D. José Policarpo [Público, 23 Dezembro 2002] fiquei perplexo como nos dias de hoje algumas pessoas ainda utilizam os homossexuais como bodes expiatórios. Mais perplexo fiquei vindo de uma pessoa com a formação e responsabilidade de D. José Policarpo.
Diz D. José Policarpo (sobre como evitar a pedofilia na Igreja):
Pergunto eu como se define uma "personalidade homossexual"? Pergunto, porque uma coisa é a orientação sexual de cada um, outra coisa é a sua personalidade. D. José Policarpo tenta, como muitos outros antes dele, fazer a colagem entre as duas coisas. E porquê? Porque é que alguém com responsabilidade numa instituição como a Igreja faz este tipo de confusão? Como é que alguém que pertence a uma instituição que recentemente afirmou:
Pode vir agora "carimbar" de pedófilos todos aqueles que tem uma orientação sexual homossexual (ou mesmo todos aqueles que tenham vestígios de homossexualidade)?
Porque afinal é disto que se trata: D. José Policarpo afirmou nesta entrevista que a forma de resolver o problema da pedofilia dentro da Igreja passa simplesmente por não permitir que pessoas homossexuais sejam padres.
Esta "solução" tem duas consequências graves:
2) Ao fazer a associação pedofilia ßà homossexualidade está de forma fria, cruel e calculista a promover a discriminação de um conjunto de pessoas que não escolheram ter uma orientação sexual diferente da maioria da população.
A verdade é que ser homossexual não é nem nunca será impedimento de ser um ser humano e exercer qualquer função (desde futebolista a padre), desde que seja essa a sua vocação. O problema da pedofilia na Igreja (assim como de muitos outros problemas desta instituição) resolve-se sim tomando medidas para resolver e prevenir as situações concretas e não com tomadas de posição demagógicas...
João Paulo
Editor PortugalGay.PT
Extracto da entrevista:
O problema da pedofilia também tocou a Igreja, nomeadamente nos Estados Unidos. Aí foi levantada até a dúvida se não haveria uma relação entre os abusos cometidos e o tema do celibato dos padres.
Não, não. Basta ver que quatro quintos dos casos em investigação de pedofilia passam-se dentro de famílias. O celibato é um caminho, não é qualquer coisa construída à partida, tal como a família também é um caminho. Qualquer vivência de uma relação é uma aventura de liberdade. Quando uma pessoa se meteu num caminho, conta com a graça de Deus, conta com a sua prudência e a sua generosidade, e vai enfrentar o incerto de uma vida concreta. Para mim, o alerta que estes casos lançam à Igreja não é tanto saber se o celibato está bem ou mal, mas quais os critérios de escolha das vocações.
A Igreja tem capacidade de escolha quando tem tanta crise de vocações?
Tem, tem. Posso-lho dizer pela minha experiência e pelo cuidado que tenho na minha diocese. O facto de sermos pouco exige que sejamos melhores, e por isso os critérios de escolha até se apertaram. Mas não lhe escondo que isto pode ser fruto de uma orientação de há dez, vinte anos atrás, em que sobretudo psicólogos - que têm na Igreja americana um grande peso - defenderam a teoria de que a homossexualidade, desde que fosse vivida de uma forma honesta e casta, como a heterossexualidade não era um obstáculo ao sacerdócio. A tendência era para dizer: um rapaz, mesmo se tiver tendências homossexuais, pode ser padre se for sério. Isto desconheceu as consequências que tem uma personalidade com marcas de homossexualidade na evolução do ministério do sacerdócio. Eu tenho uma posição completamente ao contrário - e isto não é uma tomada de posição sobre a homossexualidade -: para mim, se um rapaz tem traços de personalidade homossexuais, isso é uma contra-indicação absoluta para o ministério sacerdotal.
Entrevista a D. José Policarpo
Jornal Público 23 Dez 2002
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