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Segunda-feira, 23 Abril 2007 11:35

UGANDA
Homossexuais excluídos da estratégia do HIV/SIDA



PortugalGay.pt

Num bar de karaokê mal iluminado, num subúrbio de Kampala, capital do Uganda, Crystal Namanya imita a canção “Get into the groove”, de Madonna, seguindo a letra num ecrã de televisão.


A sua exibição atrai aplausos. “Vai ai, menina”, gritam os seus colegas da diversão nocturna.

Esta não é uma ordinária noite de karaokê. Quase toda a gente no bar é homossexual, algo que muitos ugandeses consideram não africano, nem cristão.

Em 2005, a polícia visitou este bar várias vezes. Mas agora é um dos poucos lugares onde os homens e mulheres homossexuais da cidade se sentem seguros.

A homossexualidade transporta um grande estigma no conservador Uganda. A sodomia –“um acto contra a natureza”– pode levar à prisão perpétua.

Muitos ugandeses preferem fingir que as minorias sexuais não existem, uma crença de todas as classes sociais.

"Fazem-nos sentir como se não tivéssemos o direito de existir", disse Crystal. "No dia que descobres que és homossexual, perdes tudo - as pessoas olham para ti como se fosses um doente, outros dizem que estás enfeitiçado".

Como consequência fatal da recusa da existência da homossexualidade no Uganda, o programa nacional de combate ao HIV/SIDA não toma em conta as minorias sexuais, apesar da evidência científica de que os homens homossexuais são altamente susceptíveis à transmissão do HIV.

O relatório da ONUSIDA, "SIDA e homens que fazem sexo com homens", de 2000, diz que o risco de transmissão do HIV através de sexo anal desprotegido é "várias vezes mais alto do que a categoria seguinte de mais alto risco".

A política de fingimento

Ninguém sabe qual é a taxa de seroprevalência entre os homens homossexuais no Uganda porque não há estatísticas.

"Não há menção de homossexuais ou lésbicas na estratégia nacional, porque a prática homossexual é ilegal", disse James Kigozi, porta-voz da Comissão do SIDA, do Uganda. "Estes dois grupos (homossexuais e lésbicas) são marginais, os seus números são irrisórios".

O Ministro da Saúde, Jim Muhwezi, insistiu recentemente que a abordagem ugandesa atende adequadamente a todos os grupos no país, incluindo homossexuais: "Eles não merecem uma mensagem especial. Eles não deviam existir e esperamos que não existam. Se existem, então estão cobertos pela tripla acção ABC (abstenção, fidelidade e preservativo), e deviam se contentar com isso".

Um médico ugandês que, nos últimos três anos, trabalhou de perto com as minorias sexuais, disse, em anonimato, ao PlusNews que tem a certeza de que a seroprevalência entre homossexuais é várias vezes superior à média nacional de 6 por cento

"No Uganda, quando se descobre que alguém é seropositivo não perguntamos o seu comportamento sexual, assim, temos uma estatística assumida para uma população heterossexual", referiu.

Muitos homens homossexuais desconhecem os riscos de contrair infecções através de sexo desprotegido.

O médico defende que esta ignorância é devida à "política de fingimento" sobre a existência de homossexuais, dai que incorporá-los equivaleria a admitir a sua existência.

"Há homens homossexuais no Uganda, são um grupo mais vulnerável do que qualquer outro, e por isso precisam de ser educados", salientou.

Joel, de 20 anos, homossexual de Kampala, disse que "alguns rapazes acreditam que dormir com um homem é seguro, porque todos os cartazes de publicidade na cidade mostram casais heterossexuais... nada se diz sobre os casais homossexuais usarem preservativos".

Numa pizaria que tolera homossexuais no centro da cidade, Joel contou a confusão de descobrir a sua sexualidade aos 14 anos. Desde então, ele tem sido encorajado pelo pai a fazer testes de sangue mensalmente. A atitude do pai tornou-se mais liberal após viver no Reino Unido.

Joel disse ser sortudo por ter o apoio moral e financeiro da família, o que minimizava o risco de se tornar seropositivo.

Muitos dos seus contemporâneos homossexuais não tiveram tanta sorte. Marginalizados pelas suas famílias e desprezados pela sociedade, vendem os seus corpos, iludidos pela sensação de segurança dos posters da campanha anti-SIDA.

Relutantes em contar os sintomas de infecções transmitidas sexualmente por recearem questionamentos sobre a sua orientação sexual, muitos homossexuais e lésbicas dizem que não têm escolha, nem oportunidade de serem honestos sobre a sua sexualidade.

Poucas alternativas

O relatório da UNAIDS apela aos governos para adoptarem uma abordagem não discriminatória em relação às minorias sexuais, mas Beatrice Were, uma analista política na ActionAid, disse que tal abordagem nunca foi adoptada no Uganda.

"As nossas mãos estão atadas nas nossas costas pelas leis", disse. Em 2005, o parlamento ugandês passou uma emenda à Constituição proibindo casamentos homossexuais.

Were admitiu que o preconceito entre as ONGs significava que elas, também, não atenderiam às minorias sexuais. "Muitos de nós não praticam o que pregam. Ainda não resolvemos os nossos próprios receios e estigmas e por isso somos parciais nas acções de prevenção", disse.

O resultado é que aos homossexuais homens e lésbicas é negado o aconselhamento e tratamento.

"Agora nós temos de ser honestos connosco próprios e falar sobre as minorias sexuais", concluiu.

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