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Domingo, 18 Setembro 2011 22:35

PORTUGAL
“Luana Muniz, a Rainha da Lapa”



PortugalGay.pt

A cidade de Braga foi palco para o ensaio fotográfico de Pedro Stephan, “Luana Muniz, a Rainha da Lapa”, um foto documentário sobre a transexual Luana, que contou com a presença da ministra da cultura entre outras individualidades.


Depois de Pedro Stephan ter agitado o Brasil de norte a sul apresentado a nova “Madame Satã”, seguiu para Itália, para estar presente numa das mais importantes mostras de fotografia o “Turin Photo Festival”, que se rendeu há magia da imagem.

Falamos com Pedro Stephan, a quem colocamos algumas questões e que de forma solta e descomplexada nos esclareceu:

- Depois do sucesso que foi Brasil e Itália, porquê Portugal e mais

concretamente Braga?

Porque em Braga acontece o “Encontros da Imagem”, o mais importante festival internacional de fotografia de Portugal, um festival voltado para o documentarismo fotográfico, que é a área na qual meu trabalho se insere. Os Encontros da Imagem é um evento que começou em 1987 e já teve 20 edições, é um festival renomado e reconhecido internacionalmente, integrando o circuito de internacional de eventos de fotografia chamados de “Festivais da Luz”. Eu cheguei até aqui da seguinte maneira: meu ensaio “Luana Muniz, a rainha da Lapa” foi apresentado no FotoRio 2009, Festival Internacional de Foto do Rio, e foi muito bem recebido pela crítica especializada e pela imprensa. Então a Teresa Siza, curadora e crítica portuguesa viu a obra e me encaminhou para Rui Prata, director do festival que me convidou a participar. Para mim é uma honra fazer parte de um evento de alto gabarito artístico como este. Mas se for convidado para trazer outros ensaios ou expor a “Rainha da lapa” em outras cidades, galerias ou museus de Portugal aceitarei com certeza.

- O que esperas da tua presença em Portugal, seja quais são as expectativas?

Faço o melhor possível, dentro das minhas possibilidades e procuro não ter expectativa alguma, mas gostaria de dizer que minha obra tem antes de tudo uma qualidade artística, tem uma linguagem, tem um olhar e merece ser conferida pelo grande público e pelo público LGBT como aquilo que é: arte.

No Brasil foi uma loucura a reacção das pessoas, a galeria teve que contratar duas novas funcionárias e pôr faixas no chão, porque era muito público. A gerente da galeria ficava enlouquecida com aquele “povaréu”, mas ao mesmo tempo maravilhada com o afluxo de gente de todas as idades, níveis sociais e orientação sexual. Se por um lado existe o estigma e demonização sobre o assunto, por outro há uma imensa curiosidade do público sobre essa temática pouco explorada, ou abordada sempre de uma maneira condenadora e sob uma estética “trash”. Eu vou na contramão disso, e lanço um olhar benevolente e humanizado a esses seres humanos, que tem uma maneira ser tão rejeitada pela sociedade.

- Esta tua exposição apresenta-nos uma pessoa Transexual, que

pretendes tu, é apenas uma apresentação estética ou é mais que isso?

O ensaio que fiz ao longo de 3 anos no bairro boémio da Lapa é antes de tudo uma obra artística, mas como abordo a temática da prostituição transgênero, que considero a mais maldita de todas, tem uma questão política sim. No Brasil a meta da militância LGBT é capacitar as trans para inseri-las no mercado de trabalho, para que possam ter outras opções de ofício além da prostituição, que actualmente é a única forma de ganharem a vida. Mas existe o outro lado dessa questão: muitas querem e gostam de se prostituir, e a prostituição é a profissão mais velha do mundo, e é uma profissão sim, pode ser um importante serviço prestado as pessoas carentes de sexo e de contacto físico. Porque estar saciado sexualmente é tão importante para nossa saúde física e mental quanto comer e beber. Esse preconceito que temos com a prostituição tem um fundo religioso, não é uma visão racional humanista e sim moralista. A prostituição não vai acabar nunca, então uma outra estratégia seria legalizar essa profissão, dar garantias trabalhistas, carteira profissional, aposentadoria (reforma), e também desfazer essa visão negativa sobre a prostituição transgênero, elas não são monstros, são seres humanos, querem ser aceitas e integrar nossa sociedade. Meu ensaio é muito delicado e mostra o outro lado da moeda: que elas encarnam uma fantasia, são damas da noite e seu trottoir é um ballet, e podem ser carinhosas e sexys com seus clientes. E também que são seres humanos como outros quaisquer, fazem pausa na “batalha” para beber refrigerantes, bater papo, e assistir mais uma capitulo da telenovela torcendo para que a mocinha tenha um final feliz.

- Acreditas com certeza que a imagem tem um imenso poder, se não, não estarias a apresentar este trabalho, que mudanças registas tu após uma exposição tua, que feedback as pessoas te tem dado?

Eu comecei minha carreira nos museus e galerias sendo censurado e tendo que enfrentar uma briga política pública para poder exibir meu ensaio “Entre Amigo e Amores os espaços de socialização GLS do Rio” e nesse primeiro passo o público gay brasileiro e carioca e ainda pessoas LGBTS do exterior participaram activamente. Houve uma campanha pela internet e na grande imprensa, a imprensa gay me apoiou (inclusive o Portugal Gay), ONGs gays e de direitos humanos me apoiaram a OAB, Ordem dos Advogados do Brasil, me apoiou, enfim foi uma guerra que ganhamos juntos. Então quando a exposição abriu e aconteceu no FotoRio 2007 foi uma vitória comemorada, as pessoas vieram e em seguida a exposição teve muito público em todos os festivais onde foi exibida. Depois de rodar o Brasil a expo voltou ao Rio e fez mais sucesso ainda: foi recorde de público no Centro Cultural da Justiça Federal. Eu sempre faço minha obra: 1- para grande público porque arte é moeda corrente, é instrumento para se criar um nova e boa imagem de uma minoria demonizada, sobre a qual só se tem condenação.

2- e para o público LGBT que precisa se ver de uma forma positiva, porque vive numa sociedade esmagadoramente heterossexista, e olha á volta e só vê o modelo heterossexual de estilo de vida.

Mas quando eu levei o “Entre Amigos” para Madrid eu não fiz muita fé, porque achei que estava falando do Rio, do Brasil, e lá a realidade deles era outra. No dia após a inauguração eu pensei “bom, não vem ninguém, eu vou dar um alô na galeria e depois vou para o Museu do Prado”. Mas cheguei na galeria, já estava lotada e não parou mais de chegar gente, de todo o tipo, de todas as idades, pais com filhos pequenos, senhoras, grupos de gays e lésbicas, adolescentes hetero com as namoradas etc. Quando eu assustei eram 9 da noite, e eu não tinha nem tomado café da manhã, e eu nem senti falta, porque foi um dos momentos mais emocionantes da minha vida. A exposição foi um sucesso e teve o mesmo impacto que no Brasil, porque as imagens falavam de vida, de humanidade, de amor e amizade.

Com a “Luana, rainha da Lapa” eu já disse: foi uma loucura, os professores das secundárias escolheram a exposição como fundamental para ser vista pelas turmas, por falar da diversidade, mas os professores das universidades também fizeram o mesmo e dos cursos de fotografia idem. Um dia eu entrei na galeria e tinha uma professora de curso universitário de fotografia, dando uma aula sobre a exposição para uma turma enorme de alunos. Eu cheguei de fininho e assisti a aula, foi o máximo. Fiz 3 dias de visitas guiadas, cada dia tinha pelo menos 2 sessões com um bom público. Todos os críticos importantes e fotógrafos famosos foram ver a exposição e elogiaram, mas um dos momentos mais legais foi quando passou uma turma de “skateiros” na porta da galeria, e um deles quis entrar, os outros torceram o nariz, mas ele entrou sozinho e começou a ver a expo. Depois os outros vieram, eram uns 11 rapazes e eu pensei “e se eles derem um ataque e resolverem quebrar tudo por aqui?” mas eles adoraram e eu acabei exibindo a projecção de slides que tem as 140 imagens que compõem a obra, e falando sobre o ensaio fotográfico. No final eles disseram “pôxa cara, isso é totalmente rock n´roll!!”. Olha, isso valeu cada momento de angústia e insegurança nos 3 anos que passei fotografando a Luana e suas amigas na noite da Lapa, porque não sabia se um dia iria conseguir expor aquelas imagens.

- Na inauguração da tua exposição em Braga com que brindamos, cachaça

ou champanhe.

Vou convidar o grande público e em especial todos os meus irmãos GLBTS para beber um bom vinho português comigo.

Foi esta a entrevista possível com Pedro Stephan, uma entrevista emocionante e diria também um excelente convite para todas as pessoas indiferente de qualquer postura sociocultural estejam presentes na galeria “SHOW ME - design & art gallery” cita na Rua D. Frei Caetano Brandão, 214, em Braga, para desfrutar da imagem de “Luana Muniz, a Rainha da Lapa” que estará patente desde este sábado e até 30 de Outubro.

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