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Política & Direitos


4 Junho 2003

Embora o actual regime jurídico da adopção discrimine abertamente os casais homossexuais, o acesso dos casais homossexuais à possibilidade de adopção não tem sido a preocupação principal das Associações de defesa dos direitos LGBT - porque, infelizmente, há outras formas de discriminação ainda mais graves.

Contudo, num momento em que a adopção está a ser discutida publicamente, não podíamos, enquanto cidadãs e cidadãos responsáveis, deixar de contribuir para um esclarecimento dessa questão, alertando para informação de que dispomos e que tem sido ignorada.

Não duvidamos, por um segundo sequer, que os interesses e direitos das crianças são soberanos e prioritários em relação a quaisquer outros. Por isso mesmo, temos o dever de chamar a atenção para o facto de que, enquanto muitos milhares de crianças estão em orfanatos e instituições onde não têm o carinho e a atenção de que necessitam, há muitos casais homossexuais excluídos da possibilidade de as adoptar, independentemente do seu nível moral, financeiro, cultural e afectivo. É nossa convicção que esta exclusão a priori é exclusivamente baseada no preconceito - e é prejudicial para todos, sobretudo para essas crianças. E esta nossa convicção é baseada em factos, e apoiada pela ciência.

A possibilidade de adopção por casais homossexuais existe em vários países europeus, incluindo o Reino Unido, a Holanda, a Suécia e a Dinamarca - e também em muitos Estados dos EUA. Há, por isso, dados disponíveis que devem ser considerados em qualquer análise séria da questão. Uma sondagem efectuada nos EUA nos anos 90 revelava que a percentagem de mães entre mulheres lésbicas e mulheres heterossexuais era já muito semelhante (62% e 72% respectivamente), embora somente 27% dos gays inquiridos fossem pais de crianças contra 60% dos homens heterossexuais; estimou-se ainda que o número de crianças com um pai gay ou uma mãe lésbica estaria na ordem dos milhões. Esta realidade permite já uma análise sólida. E essa análise é feita num relatório publicado em Fevereiro de 2002 pela American Academy of Pediatrics. As suas conclusões enfatizam a semelhança entre homo- e heterossexuais no exercício dos papéis parentais em aspectos como "atitudes parentais, comportamento, personalidade e ajustamento dos pais", sendo também semelhante o "desenvolvimento emocional e social da criança", assim como a "identidade de género e orientação sexual da mesma".

O argumento de que filhos de gays e lésbicas tenderão a ser também gays e lésbicas é obviamente preconceituoso, porque pressupõe que ser gay ou lésbica é negativo - mas para além disso, é portanto factualmente errado (o que é confirmado ainda pela American Psychological Association).

Também a habitual preocupação quanto a uma possível pressão social a que as crianças pudessem estar sujeitas no ambiente escolar é rejeitada: a realidade é que as crianças conseguem perceber e explicar bem as suas famílias a colegas e professores. Este mesmo argumento já foi, aliás, aplicado no passado - por exemplo, à questão do divórcio - tendo a preocupação desaparecido com o surgimento de exemplos concretos (é hoje claro que os filhos de casais divorciados se tornaram rapidamente aceites).

Quanto ao por vezes invocado "perigo da ausência de uma figura paternal ou maternal", ele não é um argumento sério, pois essa ausência já acontece em múltiplos casos que nada têm a ver com orientação sexual - aliás, a adopção monoparental existe também em Portugal. Mas sobretudo não se pode hoje continuar na ilusão de que os "pais" são os únicos agentes de socialização, num mundo feito de redes de amigos, famílias alargadas e recompostas, modelos mediáticos, professores e colegas. É aliás o mesmo relatório da American Academy of Pediatrics que afirma que "as crianças são aparentemente muito mais influenciadas pelos processos/sinergias familiares que pela estrutura familiar". A conclusão é simples: proporcionar um ambiente familiar estável a uma criança, ambiente em que os pais, independentemente da sua orientação sexual, manifestam satisfação na sua relação, grande amor pelas crianças e poucos conflitos interparentais, é claramente preferível a deixá-las ao cuidado de instituições.

É obviamente irresponsável advogar que qualquer casal, quer homossexual quer heterossexual, possa adoptar uma criança - mas será igualmente irresponsável excluir à partida potenciais adoptantes com base no critério da orientação sexual. Crianças que merecem ter figuras parentais não podem deixar de tê-las com base em preconceitos ou falta de informação do legislador. Pedimos, por isso, e apenas, que a análise desta questão seja feita com seriedade e cientificidade.

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