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Quarta-feira, 13 Abril 2005 00:57

TIMOR LESTE
Governo de Díli e a Igreja voltam a desentender-se



Uma medida experimental que o Governo de Díli pretende introduzir em 32 escolas do país está a gerar uma troca de acusações entre o primeiro-ministro, Mari Alkatiri, e a hierarquia da Igreja católica timorense. As duas partes emitiram nos últimos dias dois comunicados violentos, que vão para além da mera discussão sobre o ensino de religião no país. Trata--se da segunda vez que Díli e a Igreja entram em desacordo.


Os bispos D. Alberto Ricardo da Silva, de Díli, e D. Basílio do Nascimento, de Baucau, acusam Alkatiri de atentar "contra a convicção e referências fundamentais dos timorenses", ao mesmo tempo que "minimiza a Sagrada Escritura". Por sua vez, o chefe do Governo diz que a Igreja "quer desempenhar o papel que é próprio da oposição numa sociedade democrática".

O diferendo teve início quando o Governo anunciou que irá remeter para as várias confissões religiosas o ensino da disciplina de religião, pagando aos professores que a leccionem. Uma disciplina do ensino primário até agora obrigatória, mas que o Executivo quer tornar facultativa e retirar peso na avaliação final dos estudantes.

Os dois bispos católicos mostram-se contra esta medida mas, num comunicado conhecido segunda-feira, argumentam que os timorenses, mais do que estarem preocupados com a questão do ensino da religião, estão atentos ao que é referido como tratar-se de uma "diferença real de ideologias, princípios, valores e expectativas entre o Governo e o povo". Nas cinco páginas do documento divulgado pela agência Lusa, os bispos timorenses referem-se ao Executivo como "Governo Alkatiri".

D. Alberto Ricardo da Silva e D. Basílio do Nascimento contestam também a intenção de Timor-Leste e a Indonésia criarem uma Comissão da Verdade e Amizade (CVA), constatando que "a rejeição da consciência cristã pelo Governo Alkatiri indicia outras decisões políticas que pretendem negar o direito do povo à justiça".

Em Dezembro de 2004 foi anunciada a decisão de criar a CVA para investigar os crimes contra a humanidade perpetrados em 1999, aquando da organização e realização do referendo que ditou a separação de Timor e da Indonésia. A onda de violência provocou a morte de 1500 pessoas e o êxodo forçado de 250 mil timorenses.

Os bispos acreditam que a criação da CVA não garante a reparação moral das vítimas nem assegura o castigo dos responsáveis. "O povo não aceitará a impunidade por crimes contra a Humanidade. As vítimas, as suas famílias e o povo em cujo nome tais crimes foram cometidos não merecem menos que isso", dizem.

Essas vítimas "merecem uma responsabilidade real pelos crimes contra a Humanidade cometidos entre 25 de Abril de 1974 e 31 de Dezembro de 1999, e exigem processos criminais em tribunais nacionais ou internacionais", como estipulado na Constituição.

reacção. Em resposta às acusações dos bispos, o primeiro-ministro emitiu ontem um comunicado em que acusa a hierarquia da Igreja católica de se ter transformado num "partido político". Na opinião de Alkatiri, o comunicado surge como "um claro grito de afirmação de vontade", já que a Igreja "sente-se pequena na sua função evangelizadora" e "quer ditar as regras de Governo do país".

No mesmo documento é ainda criticada a "oportunidade" da decisão de "pôr em causa a legitimidade política do I Governo Constitucional" - nas vésperas da nova conferência de doadores, momento essencial do processo de aprovação do Orçamento do Estado para 2005/2006, e durante a visita do Presidente indonésio, Susilo Bambang Yudhoyono, ao país.

Alkatiri recorda os resultados das recentes eleições distritais para mostrar que o "Governo e o partido que o sustenta [Fretilin] não estão de costas voltadas para com os timorenses". O comunicado assinado pelo primeiro-ministro foi alvo de uma moção de apoio por parte do Conselho de Ministros.

Apesar dos ataques, ambas as partes mostram-se disponíveis para o diálogo. A Igreja timorense limita contudo o "diálogo construtivo" à moralidade, à justiça para os crimes contra a Humanidade e aos assuntos de "justiça social que preocupam o povo".

Por seu lado, o primeiro-ministro apela a um "diálogo genuíno, sincero, sem subterfúgios retóricos". Um tipo de discurso que, afirma, "o tom do comunicado dos bispos não indicia". Alkatiri desafia por isso a Igreja a integrar uma comissão de acompanhamento da reforma experimental dos currículos, no âmbito do Parlamento.

antecedente. Trata-se da segunda vez que Alkatiri põe em causa as "interferências" da Igreja católica na política. Em 2002, criticou o então bispo de Díli e Nobel da Paz, D. Ximenes Belo, quando este afirmou que os governantes passavam mais tempo no estrangeiro do que em Timor "Voam de um país para o outro à procura de dinheiro, mas a realidade é que a população espera que os problemas do dia-a-dia possam ser resolvido."

Certo é que outros hierarcas católicos já fizeram um apelo para o fim desse protagonismo político. Em Maio de 2002, o cardeal- -patriarca de Lisboa, D. José Policarpo, disse que a Igreja timorense "tem de perder o protagonismo político que teve até agora e aparecer diante da comunidade como um serviço e não como um poder".

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