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Carta ao Director do Jornal Público

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30 Agosto 2004

Os recentes comentários de Maria Filomena Mónica, na sua coluna deste jornal, acerca do Big Brother, inglês e português, nada teriam de mais para me levar a pronunciar, visto ser uma análise que considero interessante e inteligente, que na generalidade subscrevo, a não ser um pequeno, mas significativo comentário, ao comparar o Zé Maria à Nadia e ao considerá-la uma "aberração da natureza".

Primeiro, convém desde já esclarecer, que sendo eu uma transexual, me sinto pessoalmente atingida e insultada, daí este meu impulso de escrever esta carta, mas ainda mais vindo de uma pessoa que considero bastante culta, para não falar daquilo que não sabe, e suficientemente civilizada e de abertura de espírito para não alimentar preconceitos vulgares e discriminatórios.

Ser transexual, é ser alguém que não se identifica na sua identidade do género, com os seus órgãos genitais, e embora sejamos uma percentagem muito reduzida da população em geral, existimos e sempre estivemos presentes ao longo da história da Humanidade, não como "aberrações da natureza", mas como seres humanos, tanto na sua grandeza como fraqueza. Faz parte das sociedades civilizadas e cultas, que considerava ser um dos pilares das ideias que MFM defendeu e tem vindo a defender ao longo destes anos de intervenção cultural, valorizar e tratar como seres humanos na sua plenitude, combatendo a discriminação e falta de sensibilidade para com gente que no seu dia a dia é frágil e sofredora, por natureza.

Por aí também se mede o grau de civilização de um país, e embora não sejamos muitas e não andarmos constantemente com um rótulo na testa também em Portugal existimos, e por mim falo, empenhamo-nos em ser mais do que casos clínicos excepcionais, somos pessoas na plenitude dos nossos direitos e deveres, e a quem a sociedade deve dar lugar a poderem expressar a sua real personalidade.

Sem "querer ser cínica", mas sendo, custa-me a crer que MFM, depois de três meses em Inglaterra, o eco do que lhe chegou e que considera importante para a sua crónica é vir falar do lado "lixo" do Big Brother, e estilo tablóide vir falar da "mulher, com grande par de mamas", e não considerar como relevante e válido, como o faz, por exemplo o "Observer", um jornal de referência (como cita na sua crónica), que a vitória inédita e expressiva nos termos que veio a ter Nadia e a sua real "popularidade", coloca a questão de que, por mais remota que seja, "as atitudes na Inglaterra estarão a mudar, no sentido de uma maior tolerância e abertura de espirito, pelo menos por parte da juventude", e que a Nadia "produziu um rosto e uma personalidade real" às ideias estereotipadas que vulgarmente as pessoas têm dos transexuais, pondo a hipótese de neste caso, e nesta edição do Big Brother, estar a ser um barómetro cultural das sociedades modernas.

Como a ignorância é a mãe de todos os preconceitos, para além de ser uma coisa muito feia... neste caso ou a expressão de MFM foi um lapso de linguagem que lhe saiu infeliz, ou então MFM como ignorante que é em relação aos transexuais, não devia falar daquilo que não sabe, e se quiser sair um pouco da "sua Torre do Tombo", pode aprender um pouco sobre os transexuais, em particular em Portugal, que fazem por se assumir com dignidade, respeito e personalidade.

E se Nadia vai ser mais um pobre de espirito como o Zé Maria, isso só o tempo o dirá, mas para já Nadia é bem genuína e real.

Jó Bernardo
Trav. Do monte do Carmo, 1 1200-276 LISBOA
Tel: 21 324 03 46

Veja também:
Carta de António Serzedelo, em nome da Opus Gay, sobre o mesmo assunto.
Texto de opinião de Maria Filomena Mónica publicado no Jornal Público de 25 de Agosto de 2004.

 
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