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Manifesto 2005 - Cumprir a Constituição: Homofobia Não!

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Os novos excluídos

Nos dias que correm ficou bem mais fácil ser homossexual e vamos conquistando cada vez mais direitos, e o que ainda há bem pouco tempo parecia improvável, é hoje uma realidade que encaramos já com uma certa naturalidade.

Pensando em termos de balanço final, o que de facto se ganhou ?

Provavelmente os homossexuais estão mais próximos da integração à sociedade, podendo imitar os seus padrões, inclusive o casamento. Mas como se trata de uma sociedade injusta por base, a liberdade conquistada é falsa:

está sempre vigiada, em clima de permissividade controlada.

Agora os casais gays que vivam em comunhão de facto podem ter os mesmos direitos dos casais heteros, mas, na grande maioria dos casos, têm de continuar a fazer isso ás escondidas para não serem prejudicados pelo preconceito.

A homossexualidade deixou de ser proibida em Portugal, mas quando a policia quiser, (ainda) pode humilhar, maltratar e expulsar homossexuais apanhados a engatar num parque, ou, simplesmente, por ter trocado dois beijos num local publico, só para dar um pequeno exemplo.

O gueto homossexual geograficamente ampliado representa um ganho de direitos bastante discutível. Ainda que seja um espaço conquistado para a livre manifestação de comportamentos socialmente desviantes do padrão, o gueto na verdade não deixa de ser, um lugar de bichas e lésbicas, com tudo o que o implica de compartimentalizaçã e isolamento.

A "guetoização" concentrou um grupo determinado de pessoas num espaço específico para "esse tipo de gente" - uma espécie de campo de concentração com ar condicionado. Qual o custo ?

Em troca da ampliação do gueto e da relativa liberalização fora dele, há pesados juros a pagar.

É sabido como na cena gay só se podem cumprir as necessidades imediatas do consumo sexual: o foco de interesse concentra-se sobretudo abaixo da cintura, ignorando o restante da capacidade humana.

Trata-se, portanto, de um controlo social menos aparente e mais sofisticado: só se pode ser homossexual na fronteira exacta que abrange o sexo.

Em outras palavras, ser-se homossexual reduz-se, lamentavelmente, a fazer sexo.

Ora, o consumo de sexo passa pela garganta estreita dos padrões "vendáveis" no mercado da carne, em clima de competição baseada no exibicionismo. Criou-se para tanto um estereotipo, cada vez mais implantado, de superbichas, quer dizer homens vendendo fantasias exacerbadas, com base no tripé da virilidade, beleza e juventude.

Tal situação viabilizou um incremento desvairado do narcisismo, com todos os elementos doentios e preconceituosos ai implicados.

Basta um passeio em qualquer ambiente gay para se entediar com o desfile de barbies depiladas, exibindo a mesma virilidade teatralizada e músculos artificiais, a partir de doses maciças de hormonas masculinas e do culto ao ginásio, valores tornados superiores e absolutos.

Os mesmos corpos, os mesmos músculos, as mesmas poses...

E o antigo anseio por uma identidade, tão ciosa do direito á diferença, resultou na obsessão generalizada de buscar no outro o mais igual possível a si mesmo.

A padronização virou culto à igualdade. Ou seja, instaurou-se uma uniformização de desejo. Ao mesmo tempo, o exibicionismo e a auto-afirmação compulsiva levaram inevitavelmente ao infantilismo.

No limite, essa tendência da cena homossexual criou corpos esculturais em série, capazes de uma intensidade erótica que dura só até a próxima ejaculação, que por sua insatisfação exigirá outra, e mais outra, gerando um efeito de obsessão.

Enquanto isso, os que divergem do padrão tornaram-se os vilões do gueto. Quem são eles ? Os efeminados, os feios e os velhos, que são punidos com a excreção e a estigmatização excludentes.

Assim, os valores homofóbicos voltaram reforçados, agora também exercidos entre os próprios homossexuais.

E nem fora do gueto à salvação: basta correr os olhos pelos anúncios sentimentais gays para se notar a mesma padronização - muitas vezes acrescida daquela arcaica... "discrição".

Mais do que nunca, é preciso saber comporta-se, para não dar nas vistas. Trata-se de um secreto desejo de se identificar com o padrão da normalidade heterossexual. Em outras palavras, insuflasse ai um problema de auto estima e rechaço do seu próprio desejo.

Como o perfil da normalidade é sempre muito rígido, apareceram outros transgressores, os novos perversos, que vêm arcar com os juros, em circunstancias por vezes comprometedoras. Para dar um exemplo, a participação de bichas e travestis em paradas e festejos gays é cada vez menos tolerada pela ala das "super bichas", por entenderem, que estes "seres aberrantes" os impedem de mostrar ao mundo, de uma vez por todas, que são pessoas "normais" e que, afinal, os "anormais", são apenas uma pequena minoria, ou seja, "as bichas e os travestidos"...

Assim, em nome de um comportamento "mais adequado", instaura-se uma nova classe de excluídos, entre os próprios homossexuais. Ou seja, substitui-se uma velha normalidade por outra igualmente intolerante, exercida, em nome de uma "normalidade" hipócrita.

É normal ver gays a exporem a ridículo outros gays por serem mais efeminados assim como raramente entre estes se chama uma lésbica de lésbica. O mais normal, é que um gay se refira a uma lésbica apelidando-a de "fufa". Uma expressão reveladora de um ainda enorme preconceito contra as lésbicas, essas eternas incompreendidas ?

Todos os gays, indistintamente, rejeitam os velhos (e estes, inclusive), as bichas, os travestis, o sadomasoquismo, os gorduchos, as "fufas"...

Em resumo, a nossa sexualidade "liberada" ensinou-nos a excluir a diferença. E estamos praticando a mesma ideologia exclusivista que provocou as repressões de que somos vítimas. Não é preciso muito esforço para perceber que vai articulando assim uma nova forma de controlo social, em que os antigos "bandidos" tornaram-se policias uns dos outros.

Quer dizer, corre-se o risco de se passar directamente da agressão e contestação para a aceitação e assimilação social, deixando do lado de fora da estreita entrada o direito à diferença, esse trunfo maior dos marginalizados.

Aquilo que eles poderiam oferecer à sociedade como o seu contributo mais original - o ponto de vista das margens - começou a ser soterrado e neutralizado, em troca da aceitação como "normais".

Assim, mais do que nunca, os desviados foram sendo chamados à ordem e à discrição.

O risco, é que a luta pelos direitos homossexuais possa ter se resumido a isso:

o direito de habitar um grande gueto e receber como herança a solidão, eternamente à espera de um paraíso gay, que nunca vai chegar...

A solidão, irmã do tédio, torna-se assim a contrapartida ao "igualitarismo". Quanto se ganhará e quanto se perderá ?

A resposta cabe ás próximas gerações de desviantes, ou integrados...

Campanha contra o preconceito

Somos todos travestis

www.glsportugal.clic3.net

ver também:
Texto publicado no Jornal Expresso
 
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