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Quinta-feira, 11 Outubro 2007 23:52

ARGENTINA
Antigo capelão da ditadura de Videla condenado a prisão perpétua



Um dia, um preso disse-lhe que não queria morrer. Wernich respondeu-lhe: "Filho, a vida dos homens que estão aqui depende da vontade de Deus e da colaboração que possas oferecer"


Durante os anos da ditadura argentina (1976-83), o padre católico Christian Von Wernich teve tanta fé em Deus como no regime e nos métodos de Videla. Ontem, numa sentença histórica, a justiça condenou-o a prisão perpétua por uma longa lista de crimes de lesa-humanidade, com a Igreja local a manifestar-se enfim contra a impunidade dos torcionários do antigo regime.

O velho cúmplice da junta militar, hoje com 69 anos, foi considerado culpado, enquanto capelão da polícia da capital, comandada por Ramón Camps, de sete assassínios, 42 sequestros e 31 casos de tortura, apesar de se ter dito até ao fim inocente de todas as acusações. E de se ter mesmo negado a quaisquer declarações, excepto para apontar o dedo às muitas testemunhas, 120, que desfilaram desde o dia 5 de Julho pelo Tribunal Oral Federal 1 de La Plata, capital da província de Buenos Aires.

"O falso testemunho é o demónio, porque está prenho de malícia. Se queremos chegar à verdade, façamo-lo em paz", disse. Mas a decisão dos juízes, presididos por Carlos Rozanski, já estava tomada: prisão até ao fim da vida.

Logo que o veredicto foi pronunciado, a rua em frente estalou de vivas, palmas, gritos e lágrimas, na sua maior parte das Mães da Praça de Maio, organização fundada há 30 anos, em plena ditadura, para exigir a libertação ou saber o paradeiro dos seus filhos. Não se sabe ao certo quantas foram as vítimas dos anos de chumbo argentinos. Os cálculos apontam para 30 mil mortos e "desaparecidos" - na verdade os mortos feitos desaparecer para apagar pistas.

"É uma decisão histórica, qualquer coisa de muito forte", disse Taty Almeida, uma das mães, à televisão nacional. "A posição da Procuradoria não era sólida", declarou Marta Vedio, advogada da Assembleia Permanente pelos Direitos Humanos e da filha de uma das vítimas, Liliana Galarza.

Testemunhos

Nas alegações finais, a defesa de Von Wernich pedira a absolvição do seu constituinte argumentando que a Procuradoria, representada por Carlos Dulau Dumm, apresentara provas insuficientes da culpabilidade. Mas os juízes já tinham levado à conta de prova uma série de testemunhos.

Por exemplo, o do caso Galarza, lembrado pela IPS. A jovem foi levada pela polícia da ditadura quando estava grávida de quatro meses, dando à luz em cativeiro. A bebé, Mercedes, à semelhança de outros, foi baptizada pelo capelão da polícia, de acordo com a acta de baptismo mostrada ao tribunal, e depois dada a adopção.

E o de Luis Velazco, este sobrevivente, referido pela mesma agência. Desesperado com as torturas que sofria, contou em audiência, disse: "Padre, por favor, não quero morrer!". Resposta de Von Wernich: "Filho, a vida dos homens que estão aqui depende da vontade de Deus e da colaboração que possas oferecer. Se queres continuar a viver, já sabes o que tens que fazer".

Christian Von Wernich, tornado um emblema dos crimes da ditadura argentina, refugiou-se quando esta terminou no vizinho Chile, onde viveu sob o nome de Christian González até ser descoberto pelo jornalista Hernán Brienza e expulso para o seu país. Onde agora foi condenado numa sentença que "comoveu" a Igreja católica.

O antigo capelão ficou à mercê da justiça na sequência da declaração de inconstitucionalidade das leis ditas de "Ponto Final" e de "Obediência Devida", que davam cobertura à impunidade.

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