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João Pedro Rodrigues - O Fantasma

O Desejo

O que caracteriza a personagem do Sérgio é aquela eterna cadência do engate. Ele sai há noite e engata e satisfaz-se. No filme isso é visível? Vê-se ele a engatar? Percebe-se o percurso que existe num homossexual que anda nas casas de banho? Isso é visível para o espectador? A verdade nua e crua?

JPR: É perfeitamente transparente. E é apresentado sem nenhuma espécie de glamour nessa apresentação. O percurso dele não é bem aquele de sair á noite, dos engates de discoteca, não é bem essas coisas. Ele é mesmo aquele engate de casa de banho, de centro comercial, de jardim público, é um bocadinho mais esse circuito. E o filme é muito físico, e interessava-me mesmo filmar mesmo como se filma o desejo e mais especificamente como se filma o desejo homossexual de um homem. Embora também há depois outro lado, há uma rapariga que anda atrás dele e que é permanentemente rejeitada. Mas o desejo, esse desejo masculino, tem de passar pelo corpo, e para passar pelo corpo tem de se mostrar o corpo, e tem de se mostrar o sexo, porque senão... embora ás vezes há coisas que também são fortes por não serem mostradas, achei que neste filme eu tinha mesmo que mostrar o corpo daquele rapaz que eu tinha encontrado e que se adequava exactamente ao que eu estava á procura, ao físico, ao olhar... Eu andava á procura de um olhar... Foi muito difícil encontrar a personagem principal. Não há nenhum actor no filme que seja mesmo actor, são todos pessoas que eu encontrei na rua, eu e outras pessoas, foi um processo de tal maneira longo que não dava para ser só eu a andar a procurar. E a partir do momento em que encontrei essa pessoa foi sempre a trabalhar nesse sentido. O filme tem um lado de exposição física do corpo que não é comum. Mas que a mim era o que me interessava, o desejo carnal, eu acho que tinha mesmo que passar pelo corpo, pelo sexo...

É um filme que retrata o desejo?

JPR: não só o desejo como a insatisfação do desejo... ele é uma pessoa que não consegue parar, é o corpo atrás do corpo e é mesmo só o desejo porque não há emoções. São corpos, não são pedaços de carne, mas é um bocado assim... e ás tantas ele apaixona-se e é isso que vai provocar um amor impossível. Ele apaixona-se por um rapaz que ele sabe que nem pode chegar lá, porque é um tipo que vive num meio social completamente diferente dele, tem uma vida completamente diferente, e é heterossexual, evidentemente... As coisas estão condenadas à partida e é por isso que ele aposta neste amor, porque há um lado masoquista no filme. Ele sabe que não pode chegar aquele homem mas durante o espaço de tempo que é o filme, vê-mo-lo a andar atrás dele... há muito o ar de alguém à espreita, um bocadinho voyeur.

Pelo que consigo perceber, o filme é um mostrar, desvendar, o que é o desejo, o instinto... achas que o filme é um encadeamento de instintos? a punção sexual?

JPR: Sim, a palavra instinto está correcta, eu queria que ele funcionasse um bocadinho como um animal: eu quero e tenho, como um cão. Por isso é que há também uma ligação tão grande ao cão, ele funciona um bocadinho como um animal, mas no fim do filme ele já nem um animal é. Ele ás tantas foge, para um sítio onde ele sabe que não existe mais ninguém, mas é uma fuga desesperada... ele foge para o aterro do lixo, para um mundo que não é animal nem vegetal, é quase só mineral, e o filme tem esse lado quase fantástico, parece ser um daqueles filmes de ficção científica dos anos 50, em que se está na lua. A certa altura parece que o filme está noutro planeta.

Esta entrevista foi para o ar no programa Vidas Alternativas da Rádio Voxx (91.6 Lisboa, 90.0 Porto) no dia 18 Outubro 2000.
Transcrição e adaptação autorizada para o site PortugalGay por António Serzedelo.
 
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